Um encontro com o impossível de ensinar
Claudia Formiga (EBP/AMP)
A formação que vale começa sempre depois
Jacques-Alain Miller
Para Lacan, o real é o impossível. E o real, como sabemos, tem muitas formas de se manifestar na Escola. Para responder a essa pergunta, diria que o meu encontro com um “impossível de ensinar” se deu a partir de um desencontro, que só depois pude elaborar como um ponto de real em minha experiência de Escola.
Entrei na EBP na mesma época em que se efetivou como política a Nova Geografia, da qual a Seção Nordeste é fruto. No grupo de onde eu vim, o novo desenho de Escola, ao mesmo tempo em que captou transferências, também promoveu rupturas. Um contexto de dissolução daí decorrente produziu impasses, cujos desdobramentos alteraram laços de amizade e parcerias de décadas.
Para acolher o saldo de angústia e luto que se seguiu a esse acontecimento me servi, primeiro da análise e, depois, do trabalho de um cartel, que constituímos, naquele momento, para pensar A Escola e a formação do analista. Convocação ao trabalho de Escola conjugado à questão singular a cada um, o cartel me pareceu uma opção segura e a mais adequada para dar um tratamento coletivo ao mal-estar que me habitava. Os efeitos dessa experiência se estenderam muito além da escrita de um texto, produto desse cartel, que apresentei em uma Jornada…
As leituras e discussões nesse cartel tiveram sobre mim um efeito de real transmissão, que até então desconhecia: o de imprimir no corpo uma vivacidade e uma disposição inéditas para o trabalho.
Em Para introduzir o efeito de formação, Miller afirma que o essencial da formação está na relação com o que não se ensina. A experiência vivida como perda e seu desenlace de mal-estar encontraram no cartel um tratamento que, não buscando lhe subtrair o ponto de real, o abordou em seus efeitos. Nesse percurso, aprendi que o impossível de ensinar não é obstáculo, mas um operador, desde que encontrada uma via, um dispositivo, por meio do qual ser abordado. O cartel se revelou, assim, como lugar de aprendizado e também de ensino, no retorno à Escola de uma experiência marcada pelo impossível de ensinar.
Se o meu dizer em análise foi o que me permitiu elaborar o luto e encontrar um lugar para a alegria no fazer de Escola; no cartel, foi a elaboração junto a outros o que me possibilitou que essa perda não ficasse confinada ao silêncio.
