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EBP Minas Gerais
Uma Jornada incandescente, sob transferência

O que aconteceu de “candente”, em 2017? Perguntou-me Luiz Fernando Carrijo provocando o envio dessa nota ao Correio Express. Em conversa com a Diretoria da EBP-MG, destacamos vários momentos, onde a casa ferveu e a conversa esquentou as atividades da nossa Escola.  Mas, indubitavelmente, o trabalho rumo a XXI Jornada, por suas patas e asas, foi responsável por reunir, orientar e incandescer a Seção Minas, de forma ininterrupta, durante todo o ano. 

O inconsciente e a diferença sexual são conceitos que participam da psicanálise desde Freud, mas foi a sua atualidade clínica que nos interessou verificar à luz do ensino de Lacan. Essa necessidade partiu da constatação de que a forma como o real do gozo se resolve em nossa época tem algo a nos ensinar. A plasticidade das soluções e injunções na vida cotidiana concernidas ao gozo fálico ou àquele Outro gozo, do qual nada se fala, mas se experimenta, é uma evidência clínica incontornável!

É sabido como hoje, na arena pública, os corpos falantes se reúnem e se aglomeram para dizer, conforme destaca Serge Cottet, que a “anatomia não condiciona sua vida amorosa ou sexual, ou melhor ainda, não condiciona em nada a escolha do seu gênero. A homossexualidade está aí para provar – e bem mais ainda a transexualidade – que há sempre a possibilidade de dizer não ao determinismo ou ao destino anatômico ao preço de refazer um outro corpo que desmente a natureza.”1

Atentos às questões de sociedade e à atualidade do sintoma em nossa época, a escolha do tema de investigação da XXI Jornada da EBP-MG, resolveu dar lugar a um conectivo entre o inconsciente e a diferença sexual. Ao não ignorar a lógica do gozo, interessou-nos perguntar como o inconsciente participa dessa lógica. Com quais conectores o falasser faz a costura entre o que se localiza e o que se infinitiza do gozo?

Jacques-Alain Miller, em Habeas Corpus2, já insistia para que não deixássemos de lado o inconsciente. “Que cada um tenha seu corpo”, tal habeas corpus já indica que o que dirige a partilha, do lado homem e do lado mulher, não é a anatomia, mas sim uma outra coisa!

E foi seguindo essa trilha, durante um ano de trabalhos preparatórios, e tendo a clínica como guia, que a nossa Jornada aconteceu entre os dias 27 e 28 de outubro de 2017. Desde a abertura, com Ludmilla Feres de Faria, abrimo-nos à força surpreendente do ensino através da conferência de Jésus Santiago; aos flashes, debates e discussões estabelecidos nas salas da jornada clínica que reuniu mais de 60 trabalhos; ao ensino vibrante e preciso dos testemunhos do passe de Maria Josefina Fuentes (Pepita) e Sérgio Laia, seguidos dos comentários de Elisa Alvarenga e Luiz Fernando Carrijo, em mesa coordenada por Ana Lydia Santiago. Ao concluir, passamos à transmissão de Pierre Naveau, em “O que do encontro se escreve”, através da leitura de Antônio Teixeira e Márcia Rosa; à pergunta sobre o sexo do analista, com Frederico Feu de Carvalho e, por fim, à conversação plenária provocada pelas ressonâncias da jornada clínica evocadas pelos seus leitores AME, Antônio Beneti, Cristina Drummond, Luiz Henrique Vidigal, Ram Mandil e Simone Souto.  

Um real trabalho de Escola, da Escola de Lacan, que nos confirmou que é da experiência analítica que devemos extrair o saber que espera ser lido, seu ensino, tendo como orientação, precisamente, o real. Ao final, saímos mais esclarecidos que antes e com outras novas questões.

Por exemplo, gostaria de destacar a pergunta lançada por Jésus Santiago durante a conversação sobre a Jornada Clínica: “Haveria uma sexologia lacaniana?”. Provocado pela discussão da sala do “Êxtase de Santa Teresa D’Ávila”, ainda pergunta, a partir das pontuações de Helenice de Castro e Sérgio de Castro: “Se há uma sexologia lacaniana, haveria um elemento de père-version, ainda pouco lido, que pede para ser investigado em nossa clínica?” Fato é que só poderemos avançar no trilho da elucidação de tais questões se perseguirmos o que se passa na operação que Ram Mandil cunhou como “operação trans”, ou seja, uma clínica sob transferência.

Essa foi a nossa aposta que levamos a sério: um programa de investigação sobre o inconsciente hoje, um programa que se debruçou sobre a clínica do falasser!

A XXI Jornada se inscreveu aí e seguiremos nesse caminho.

Agradeço, em nome da Diretoria e do Conselho da EBP-MG, à presença de cada um que participou desse trabalho de Escola. Tarefa cuja condução decidida não seria possível sem o entusiasmo e parceria dos colegas diretores, Rachel Botrel, Sérgio de Castro e Sérgio Mattos, bem como, a disposição vibrante dos colegas Ludmilla Feres, que coordenou a Jornada e Jésus Santiago, a quem coube a direção da orientação.

Agora é hora de descansar, um pouquinho...  Mas não sem antes apontar o que temos pela frente, nosso horizonte.

Nossa próxima Jornada, anotem em suas agendas, acontecerá nos dias 19 e 20 de outubro de 2018. Teremos como convidada a colega Christiane Alberti, atual presidente da ECF. E convidamos para dirigir e coordenar os trabalhos Simone Souto, Diretora de Orientação, e Laura Lustosa Rubião, Coordenadora Geral.

A conversa já começou e está animada e bem viva! Não vamos recuar da clínica do falasser: essa é a nossa pegada e orientação. Nessa linha, decidimos seguir com o programa que já está em curso, indo mais longe nessa estrada com o tema: O inconsciente e o mestre contemporâneo: o que pode a transferência?

Seguiremos, portanto, do lado do falasser, investigando o que pode a “operação trans” diante do mestre contemporâneo.
Faremos uma bela e rigorosa Jornada, à altura dos impasses clínicos de nossa época.


Aguardamos todos vocês!

Fernanda Otoni Brisset
Diretora da EBP-MG

1 COTTET, S. L’anatomie c’est le destin. In: ___. L’a-graphe. Rennes: Section Clinique de Rennes/Association Uforca, 2012-2013. p. 31.

2 Disponível em: http://ampblog2006.blogspot.com.br/2016/07/habeas-corpus-por-jacques-alain-miller.html

 
   
   
   
 
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