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REVISTA AGENTE

AUTOR

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NÚMERO / EDIÇÃO

20

ANO

2023

ISSN

2318-6054

SUMÁRIO:

EDITORIAL
Marcela Antelo

DISCURSOS

  • O discurso capitalista e o impossível
    Fabián Fajnwaks
  • Histeria, desejo e gozo
    Florencia F. C. Shanahan
  • O saber em fracasso e o fracasso do saber
    Helenice de Castro
  • “O que é que, ao dizer, isso quer?”
    Tânia Abreu
  • O acontecimento do dizer
    Marcus André Vieira
  • Trans… discursos
    Flávia Cêra

Amor

  • A erosão de Eros
    Marcela Antelo
  • Ditos de Abertura
    Mônica Hage
  • Maus tempos para o amor
    Rosa López
  • De mulheres e homens
    Rosa López
  • A erosão de Eros: vigência do amor
    Silvia Elena Tendlarz
  • Ventilação analítica e o não-todo
    Gabriel Racki
  • Nur Du, quando Pina Bausch dança o amor
    Daphné Leimann
  • Só, na tua zona de ternura
    Caroline Leduc

Referências no seminário XX

  •  A periquita não toda cartesiana
    Jamile Cesar
  • Ressonâncias do Lekton em Lacan: uma nota sobre a herança estoica na psicanálise de orientação lacaniana a partir do Seminário 20
    Milena Nadier
  • Observações sobre Crátilo, de Platão
    João Klaus L. S. Seydel
  • Breve comentário sobre a ética em Aristóteles e Lacan
    Julia Solano
  • Gian Lorenzo Bernini
    Késia Ramos
  • Le dimanche de la vie, mon cul
    Nelson Matheus Silva
  • Por que Koyré?
    Alice Munguba
  • A Coisa freudiana
    Marcelo Magnelli
  • Lacan nas antípodas de Parmênides
    Giovana Reis Mesquita
  • Lacan “feat” Gregory Bateson
    Daniela Nunes Araujo
  • … é a verossimilhança?
    Débora Gil Pantaleão

Ensaio

Algumas significações lacanianas do destino
Clotilde Leguil

Psicanálise e Universidade

  • Desejo do analista e prática institucional
    Regina Fernandes Raposo

Apresentação dos Autores

Normas de publicação

Agente nº20

EDITORIAL

Amores e discursos

Marcela Antelo

O tema deste número da Agente, que hoje completa duas décadas de história, se teceu praticamente sozinho. Se Discursos, em 2021, e Amores, em 2022, foram os campos onde semeamos nosso trabalho, essa dupla significante não deixa de revelar uma parceria consistente. Não precisamos forçar a barra – é a barra que nos força. O tema mexeu com Agente, assim como o chocalho mexe com a morena de Angola.

Para nossa capa, escolhemos um cartoon americano de 1911, criado por Nedeljkovich, Rashich e Kuharich, que perturba a pirâmide do poder, a ser invertida, criada pelo Partido Trabalhista belga[1], no famoso De Zwaan Café, em Bruxelas, onde Marx escreveu o Manifesto Comunista. A realeza no topo, o clericalismo, o militarismo, o capitalismo e, na base, o povo. É curioso que se conjuguem na primeira pessoa: eu reino sobre vocês, eu rezo por vocês, eu atiro em vocês, eu como por vocês, e o povo que sabe.. eu trabalho por vocês. O copista e restaurador russo Nicolas Lokhoff, próximo de Lenin e de exílios forçados, a alterou levemente desejando a derrubada do colosso. Os americanos de sobrenome russo coroaram a pirâmide com um saco de dinheiro substituindo os reis.

A contracapa nos maravilhou mais ainda: Leonardo Dudreville foi certeiro e hiper-realista em 1924, com seu Amore: discorso primo – discurso primeiro. A pintura poderia se chamar ‘O lugar e o laço’: o amor conjugal, o amor sabor do pecado, o amor perdido, o amor sagrado, enquadrados em verdadeiras telas abertas precursoras do Zoom.

A XXV Jornada da EBP-Bahia e a XXI do IPB sobre o tema Os discursos, o impossível e o analista hoje, após um ano de trabalho sobre o Seminário 17 de Lacan, tiveram a honra de acolher seis conferências – acontecimentos, podemos dizer hoje. Flávia Cêra e sua afirmação dos discursos como objetivações dos laços; Fabián Fajnwaks e o discurso capitalista como retorno do discurso do mestre; Florencia Shanahan e a modalidade atual do rechaço do corpo na histeria; Helenice de Castro e a leitura do saber nos Seminários 17 e 20; para finalizar, Tânia Abreu e Marcus André Vieira com o discurso analítico e a capacidade de uma fala ser acontecimento. Agradecemos a todos, que nos presentearam, elucidando exaustivamente o Lacan dos discursos, o analista hoje e o impossível de cada dia.

Os Amores surgiram do trabalho anual sobre o Seminário 20 de Lacan. Para publicar, escolhemos as primeiras notas que suscitaram o título da Jornada, Erosão de Eros, e a seguir as duas conferências da convidada da Jornada, Rosa López: “Maus tempos para o amor” e “Mulheres e homens”, inesquecíveis. Dois autores, Gabriel Racki e Silvia Tendlarz, que também fizeram parte dos textos de orientação, por arejar a questão amorosa durante o último Enapol, estão incluídos neste número. Dois textos são reproduzidos da excelente revista Le diable probablement, dedicada ao amor: o de Caroline Leduc, com o amor como lugar de todos os consensos e a batalha do cinismo e a ternura que imperam, e o de Daphné Leimann, que traz Pina Bausch e suas coreografias do impossível no amor.

Dada a riqueza das nossas noites de formação permanente trabalhando o Seminário 20, decidimos publicar as intervenções breves que associados do IPB e convidados desenvolveram, tomando algumas das numerosas referências das que Lacan se serviu nesse seminário. Remeto-os ao sumário, instigante.

“Algumas significações lacanianas do destino”, de Clotilde Leguil, para ser lido com lápis na mão, inaugura a nova rubrica Ensaios.

Um trabalho surgido do curso de especialização que o IPB conduz há dezenove anos é o terceiro da série que a rubrica Psicanálise e Universidade acolhe.

Algumas palavras sobre a recente Jornada Erosão de Eros, que teve seu momento presencial, após muito tempo sem contato: partimos do significante erosão e fizemos um laço com Eros, dada a gostosa ressonância de erosão com Eros, pura paixão do som e não do sentido. O significante veio de Céline Scemama, escritora, que já não está mais entre nós. Ela o pescou no cineasta italiano Michelangelo Antonioni. Um significante não significa nada. Aprendemos isso muito cedo, logo que entramos em contato com Lacan. Um sozinho, nada. Depende de outros, depende do que se teça. Tecido, rede, cadeia, discurso, holófrase, são os diversos pontos – como no bordado, no crochê, no macramê, na tecelagem – da tessitura significante.

Parece que os italianos e L’Amore se enredaram faz séculos. Eles inventaram a palavra amor, de origem latina e DNA helênico. Primeiro, ensinaram que o amor se canta e, claro, se fala – Lacan diz que não falamos de outra coisa. Godard diz que não filmamos outra coisa. Poetas, escritores, repentistas, puxam fios de tecido por todos os lados e os embaralham com todo tipo de coisa: a morte, a guerra, a solidão, a desgraça, a devastação, o desengano, a epifania, o êxtase, a glória, a eloquência e o silêncio, a cegueira e a iluminação, a carne, a beleza, o pudor. Tecem e tecem.

Nós quisemos tecer erosão e Eros com a vida material, como a chama Marguerite Duras. Com os ditos e com os fatos, como disse Rosa López, nas fecundas entrevistas que publicamos no magnífico Boletim Erosditos, com fios e fibras lacanianas. Tínhamos no alforje duas singelas verdades verdadeiras, uma tecida por Freud e outra por Lacan. Freud explica: a vida amorosa sofre degradação. Lacan sentencia: isso falha, literalmente: “Isso rateia. É algo objetivo”[2]. Restava-nos tecer a maneira e os modos atuais do falhar.

O poeta Leonard Cohen também diz que há uma greta no todo, mas que só assim entra a luz. Uma luz lateral, pois, assim como a morte, o amor é refratário a focos frontais. O fato de a luz entrar não significa que no tema que nos convoca não cessemos de dar nó em pingo de água. Curiosamente, o deus Google – como o chama Miller – me ensinou que pode se dar nó em pingo de água. É só pegar um barbante de algodão, como Lacan fez, pingar uma gota, aguardar que absorva, e dar um nó. Cessa de não se escrever, como o amor.

Interessa-nos transmitir aos leitores a erosão que a escrita da letra de gozo no corpo provoca. Esse gozo que se evoca como um desgaste no romper de um semblante, como disse Lacan em “Lituraterra”[3], e que no real se apresenta como erosão, ravinement, sulco. Corpos marcados, erodidos pelo real do amor.

Finalmente, agradecemos a todos os autores, rendeiras e rendeiros, aos que provocaram este trabalho e aos que o dão a ler, especialmente a Milena Nadier, Luiz Morando e Bruno Senna, pelo seu zelo editorial.


[1]    Cf. Pyramide à renverser. Disponível em: https://3.bp.blogspot.com/-ub90rETVOSw/WSBZL3CCuzI/AAAAAAAAAZw/y7lNDjTyqiELAdjipgcNlt0wMxChRqM_wCLcB/s640/4.jpg

[2]    LACAN, J. O seminário, livro 20: Mais, ainda. (1972-1973) Texto estabelecido por Jacques-Alain Miller. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1985. p. 54.

[3]    LACAN, J. Lituraterra. (1971) In: LACAN, J. Outros escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2003.  p. 22.

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